Rogério Portela Advogado

O que é desvio de função no trabalho e como evitar que aconteça com você

Infelizmente, casos em que um trabalhador é contratado para um determinado trabalho e acaba por desempenhar outro são bastante comuns. É o que chamamos de desvio de função no trabalho, a despeito do acordo firmado entre empregador e empregado no contrato de trabalho.

Esse tipo de prática fere os direitos trabalhistas. Portanto, a seguir, explicarei detalhadamente tudo o que você precisa saber a respeito para tomar as devidas medidas caso venha a passar por esse tipo de situação.

O que é função dentro de um trabalho?

Dentro de um ambiente profissional, cada trabalhador possui um conjunto de atribuições, assim como de direitos e deveres específicos que definem suas atividades laborais. Isso chamamos de função.

Essas funções podem ser definidas de várias formas: por meio do contrato de trabalho, pela convenção trabalhista do sindicato da categoria ou ainda pelo diploma do trabalhador.

E o que é desvio de função no trabalho?

Uma vez explicado no que consiste o conceito de função, posso explicar melhor sobre do que se trata o desvio de função.

Tal situação ocorre quando um determinado trabalhador se encontra a desempenhar funções que não correspondem às que foram originalmente atribuídas a ele.

Para identificar esse tipo de irregularidade, deve-se observar o contrato de trabalho. Caso os termos do documento sejam incompatíveis com as funções desempenhadas pelo empregado, há desvio de função em curso.

É importante frisar que, para que um trabalhador desempenhe funções que não estejam originalmente previstas no contrato, é necessário que o documento seja previamente atualizado.

Quais são as diferenças entre acúmulo e desvio de função?

É comum haver uma certa confusão entre ambos os termos. O desvio de função consiste em desviar o trabalhador de sua área de atuação para que este desempenhe atividades incompatíveis com suas competências, e que deveriam ser delegadas a outros profissionais.

Por outro lado, o acúmulo de função é caracterizado por situações em que um único empregado é designado a exercer funções extras que, embora correspondam às suas competências, não constam no que está disposto no contrato de trabalho.

Quais problemas podem acontecer em caso de desvio de função?

O desvio de função é prejudicial para ambas as partes. A pessoa empregada em tal situação tende a ficar sobrecarregada, desmotivada e apresentando baixa produtividade – dentro e fora do âmbito profissional.

O empregador, por sua vez, perde credibilidade e prestígio diante de seus funcionários, além de estar sujeito a processos trabalhistas.

Uma vez comprovada a irregularidade, será exigido do empregador o pagamento de uma multa, calculada com base no valor salarial do empregado, e considerando não apenas todos os salários recebidos desde o início do desvio de função, como também outros benefícios: aviso prévio, férias, 13º salário, FGTS, horas extras e adicionais (noturno, insalubridade, periculosidade, sobreaviso e de transferência).

O que diz a lei sobre desvio de função?

Embora não haja, na Constituição, uma lei específica sobre desvio de função, a mesma permite um questionamento sólido sobre essa prática abusiva, diante do princípio da boa fé. E, para além disso, alguns artigos do Código Civil e da CLT oferecem base legal sobre o tema:

O Art. 884 do Código Civil veda o enriquecimento sem causa, garantindo que ao lesionado a restituição do valor logrado. Vale lembrar que o Art. 8º, parágrafo único, da CLT, estende os termos desse artigo do Código Civil às relações trabalhistas. Já o Art. 927 do Código Civil determina que danos causados a outrem, por ato ilícito sejam separados pelo infrator.

A CLT, em seu Art. 468, determina a inalterabilidade unilateral do contrato de trabalho – em outras palavras, impede que mudanças de cargo ocorram por decisão exclusiva do empregador.

Há ainda as Orientações Jurisprudenciais, próprias da Justiça do Trabalho, que servem ao propósito de orientar as decisões dos tribunais em casos que careçam de leis especificamente definidas. Neste sentido, a OJ-SDI nº 125 diz:

“O simples desvio funcional do empregado não gera direito a novo enquadramento, mas apenas às diferenças salariais respectivas, mesmo que o desvio de função haja iniciado antes da vigência da CF/1988. 

Assim, provado o desvio de função, terá o empregado o direito ao recebimento das diferenças salariais entre seu cargo e o exercido desvirtuosamente, respeitada a prescrição de 05 (cinco) anos de acordo com a súmula 275 do TST.”

Portanto, com base em todos esses termos legais, é possível afirmar que o trabalhador tem total direito de desempenhar exclusivamente as funções para as quais foi contratado. Caso seja de comum acordo entre as partes, é possível alterar o contrato, contanto que se trate de uma decisão bilateral.

Essas mudanças de contrato podem ser chamadas de verticais ou horizontais. Mudança vertical ocorre quando o trabalhador é promovido de seu cargo para um hierarquicamente mais alto. Já a horizontal ocorre quando o empregado é deslocado de um setor ou serviço para o outro, mas ainda dentro do mesmo nível na hierarquia da empresa.

Contudo, esse tipo de mudança não pode levar o funcionário a desempenhar outra função, tampouco acarretar-lhe prejuízos salariais ou profissionais. Via de regra, essas mudanças não são permitidas caso impliquem em rigor excessivo, desfigurem a qualificação do empregado ou ponham à prova sua integridade física ou moral.

O que um trabalhador dentro desse quadro pode fazer a respeito?

As leis trabalhistas existem com a finalidade de proteger o empregado, considerado o elo mais fraco nas relações de trabalho, e para combater situações de exploração e abuso de sua força laboral em prol do enriquecimento ilícito de seu contratante.

Dito isso, qualquer mudança em suas atribuições diante do que foi originalmente acordado no contrato de trabalho deverá ocorrer de comum acordo entre ambas as partes e ser anotada na carteira de trabalho. Evidentemente, há de se respeitar as devidas diferenças salariais.

Caso essas condições sejam violadas, o trabalhador deverá procurar um advogado trabalhista ou o sindicato de sua respectiva categoria, para reclamar seus direitos junto à justiça.

Convém lembrar que há um prazo de cinco anos para o ingresso deste tipo de ação – após esse prazo, não será mais possível recorrer. Portanto, é importante que o trabalhador mantenha-se sempre atento às condições sob as quais desempenha suas atividades, a fim de poder fazer valer os seus direitos em caso de abusos ou ilicitudes.

Caso tenha dúvidas referentes a este assunto, sinta-se à vontade para entrar em contato comigo pelo WhatsApp. Terei prazer em atendê-lo.

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